Pagar taxas indevidas, desconhecer como se calcula a correção da parcela do imóvel, não receber o que foi prometido na hora da compra.
Todos esses problemas podem acontecer com quem vai comprar um imóvel na planta, diz o advogado Marcelo Tapai, presidente do comitê de habitação da OAB-SP. "Comprar um imóvel na planta exige alguns cuidados, pois se está comprando algo que ainda não existe."
O advogado está finalizando um manual para orientar o consumidor sobre compras na planta. Segundo ele, é comum que consumidores paguem taxas de corretagem e assistência jurídica sem saber que são cobranças indevidas. "A taxa de corretagem deve ser paga por quem contratou o corretor. No caso de um stand de vendas, quem faz isso é a construtora. Portanto, cabe a ela pagar o corretor", diz.
A cobrança da taxa do Serviço de Assessoria Técnico-Imobiliária (Sati) também é contestada pelo advogado. "Não tem sentido o cliente pagar um advogado vinculado a uma empresa para que ele analise o contrato dessa empresa. E cobram cerca de 0,8% do valor do imóvel para isso."
Em ambos os casos, Tapai diz que a Justiça tem mandado as construtoras devolverem o dinheiro ao consumidor quando este busca seus direitos.
O Sinduscon, que representa as empresas de construção civil, não comentou os problemas apresentados até a conclusão desta reportagem.
Reajuste da parcela pode impedir financiamento
Além disso, a falta de informação sobre como a inflação vai afetar o preço do imóvel pode deixar o cliente sem dinheiro para quitar o saldo devedor ou fazer o financiamento na hora da entrega das chaves.
O problema é que o Índice Nacional da Construção Civil (INCC), utilizado para reajustar as parcelas, tem subido acima da inflação oficial. Além disso, o índice corrige todo o saldo devedor, o que faz com que a dívida aumente consideravelmente.
Num imóvel de R$ 300 mil, o comprador dá R$ 20 mil de sinal e paga 36 parcelas de R$ 1.000. As parcelas e o saldo a pagar são corrigidos todo mês (na simulação, o advogado considerou INCC de 0,65 % ao mês).
Assim, a primeira parcela a ser paga é de R$ 1.000 e o saldo devedor total, de R$ 280.000 (descontados já os R$ 20 mil de sinal). Na segunda parcela, o valor a ser pago, já corrigido pelo O,65% do INCC, será de R$ 1.006,55. O valor do saldo devedor corrigido será de R$ 281.834,00. O saldo devedor total, após o pagamento da parcela, será de R$ 280.827,45.
Na 36ª parcela, o valor da prestação será de R$ 1.264,95, o saldo corrigido será de R$ 309.912,29, e o saldo devedor será de R$ 308.647,34.
Na entrega das chaves, o consumidor terá pago um total de parcelas de R$ 41.715,00, além do sinal de R$ 20 mil. E o saldo devedor ainda será maior que o valor inicial do imóvel.
Veja, a seguir dicas para evitar problemas:
Atraso da obra
O contrato permite que as construtoras atrasem até 180 dias a entrega da obra. O advogado Marcelo Tapai diz que a demora deve ser justificada. Se for superior a esse prazo, o consumidor pode pedir na Justiça indenização por danos materiais e morais. A indenização costuma ser de 0,8% do valor atualizado do imóvel por mês de atraso
Correção pelo INCC
A correção pelo Índice Nacional da Construção Civil (INCC) é legal, mas deve ser bem explicada para o consumidor. A correção incide sobre o saldo devedor, o que aumenta a dívida ao longo do período. Segundo Tapai, o ideal é que a parcela seja mais alta para amortizar mais a dívida: cerca de 1% do valor do imóvel ao mês. Um saldo devedor muito alto pode impedir o financiamento
Minha Casa, Minha Vida
Quem usa financiamento do Minha Casa, Minha Vida precisa considerar que o imóvel pode se valorizar durante a obra e ultrapassar o limite do programa. O problema não acontece com os imóveis que já são financiados pelo programa desde o início da obra
Promessas de benefícios não cumpridas
Carro zero, armários planejados e quitação de condomínio e IPTU. Algumas construtoras oferecem vários benefícios, mas, em alguns casos, não cumprem a promessa depois da assinatura do contrato. Nesde caso, a saída é entrar na Justiça. Guarde toda propaganda como prova
Taxa de anuência ou cessão de direitos
Valor cobrado do consumidor quando ele decide vender o imóvel a um terceiro antes que fique pronto e as chaves sejam entregues. Para conseguir vender o imóvel, o consumidor também precisa de uma prévia autorização da construtora. Segundo Tapai, essa cobrança é ilegal porque contraria o Código de Defesa do Consumidor ao remunerar uma empresa que em nada contribuiu para realizar a venda
Taxa de corretagem
Deveria pagar pelo serviço prestado pelo corretor de imóveis quem contratou o profissional. No caso de um stand de vendas, o advogado entende que são as construtoras que contratam os corretores. Caberia a elas pagar a taxa, e não ao cliente
Taxa de interveniência
É cobrada dos compradores que optam por fazer o financiamento bancário com um banco diferente daquele que financiou a obra para construtora. A taxa para mudar de banco chega a 2% do valor financiado. Fere o direito do consumidor ao restringir sua liberdade de escolher
Taxa de serviço de assessoria técnico-imobiliária (Sati)
As construtoras costumam cobrar cerca de 0,8% do valor total do imóvel neste serviço, que orienta o consumidor em questões administrativas e jurídicas. Segundo Tapai, o erro está em cobrar por um serviço que não é obrigatório nem isento, já que o advogado da empresa irá analisar o contrato da própria empresa
Fonte: Marcelo Tapai, presidente do comitê de habitação da OAB-SP - Publicado em UOL