Cláusula
contratual que estabelece a perda integral do preço pago, em caso de
cancelamento do serviço, constitui estipulação abusiva, que resulta em
enriquecimento ilícito.
Com esse
entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou
acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que determinou a perda
integral do valor de R$ 18.101,93 pagos antecipadamente por um consumidor, que
desistiu de pacote turístico de 14 dias para Turquia, Grécia e França.
Segundo o
processo, o consumidor desistiu da viagem e propôs ação de rescisão contratual
cumulada com repetição do indébito contra a empresa Tereza Perez Viagens e
Turismo Ltda., postulando a restituição de parte do valor pago pelo pacote.
Multa de 100%
O juízo
de primeiro grau julgou os pedidos procedentes e determinou a restituição ao
autor de 90% do valor total pago. A empresa apelou ao TJMG, que reconheceu a
validade da cláusula penal de 100% do valor pago, estabelecida no contrato para
o caso de cancelamento. O consumidor recorreu ao STJ.
Para o
relator do recurso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o valor da multa
contratual estabelecido em 100% sobre o montante pago pelo pacote de turismo é
flagrantemente abusivo, ferindo a legislação aplicável ao caso, seja na
perspectiva do Código Civil, seja na perspectiva do Código de Defesa do
Consumidor.
Citando
doutrina e precedentes, o relator concluiu que o entendimento adotado pelo
tribunal mineiro merece reforma, pois não é possível falar em perda total dos
valores pagos antecipadamente, sob pena de se criar uma situação que, além de
vantajosa para a fornecedora de serviços, mostra-se excessivamente desvantajosa
para o consumidor.
Abuso
Segundo o
ministro, a perda total do valor pago viola os incisos II e IV do artigo 51 do
Código de Defesa do Consumidor, que determina: “São nulas de pleno direito,
entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e
serviços que: II – subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já
paga, nos casos previstos neste código; IV – estabeleçam obrigações
consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada.”
“Deve-se,
assim, reconhecer a abusividade da cláusula contratual em questão, seja por
subtrair do consumidor a possibilidade de reembolso, ao menos parcial, como
postulado na inicial, da quantia antecipadamente paga, seja por lhe estabelecer
uma desvantagem exagerada”, afirmou o relator em seu voto.
Paulo de
Tarso Sanseveino também ressaltou que o cancelamento de pacote turístico
contratado constitui risco do empreendimento desenvolvido por qualquer agência
de turismo, e esta não pode pretender a transferência integral do ônus
decorrente de sua atividade empresarial aos consumidores.
Assim, em
decisão unânime, a Turma deu provimento ao recurso especial para determinar a
redução do montante estipulado a título de cláusula penal para 20% sobre o
valor antecipadamente pago, incidindo correção monetária desde o ajuizamento da
demanda e juros de mora desde a citação.
Fonte: STJ